ARTHUR ALMADA LIMA FILHO (17/10/2021 — 27/10/2021)

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Como se escreve sobre o fim de uma pessoa?

Do começo.

Do começo do fim.

A morte não é uma ocorrência isolada — é uma soma delas. O caxiense Arthur Almada Lima Filho faleceu neste 27 de outubro de 2021, em São Luís (MA), onde há dias estava internado no Hospital São Domingos.

Ao longo de sua longa vida, de ricos 92 anos e 10 dias, superou momentos difíceis, de traumático acidente automobilístico em Caxias a até ameaças e possibilidade de iminente prisão em (des)razão de um Inquérito Policial-Militar, quando juiz de Direito na capital maranhense.

Após queda em uma calçada em 07/10/2021, há exatos 20 dias, após visita e almoço em casa de uma grande amiga dele e de sua Família, Arthur Almada foi no mesmo dia atendido por profissional de saúde, que recomendou São Luís, como centro próximo mais avançado nessa área de atendimento médico especializado, pois acreditava haver lesões na bacia (quadril). Transportado de UTI aérea, já na capital maranhense foi realizada uma série de exames, que confirmou fraturas no quadril, as quais depois se revelaram de menor gravidade, mas exigindo de dois a três meses em casa, com os devidos acompanhamento e cuidados, para reconsolidação. Um alívio.

Em seguida, ainda no hospital, surge ou reaparece uma bronquite, inflamação nos canais que, como prolongadores da traqueia, conduzem ar para os pulmões. Submetido a tratamento, Arthur Almada apresenta melhoras e tem alta. Vai para sua residência, em apartamento de São Luís. Em um ou dois dias surgem outros problemas, como sangramento interno e falta de apetite. Inicialmente de difícil localização, descobre-se que a origem do sangramento era no duodeno, parte inicial do intestino. Surgem ou agravam-se dificuldades respiratórias. Aí vem uma conexão com o passado: o grave acidente de carro em Caxias, ainda quando jovem adulto, teria deixado, entre as sequelas, problema em um dos lados do diafragma, músculo que separa o abdômen do tórax. E Arthur viveu os tempos mais ricos e produtivos de sua vida sem maior ou nenhum problema, sem que tivesse oportunidade de ser alertado disso, pois, como o diafragma é o principal responsável pela respiração nos seres humanos, nestes últimos dias ele estava sendo mais necessário ou exigido em sua integridade.

O certo é que a indesejável batia à porta. Como maior autoridade do que sentia em seu próprio corpo, e senhor de suas emoções, o grande caxiense ainda expressou seu temor ou certeza: “ — Mira, eu vou morrer” ou “ — Mira, estou morrendo”, exclamava Arthur para a esposa, professora Miramar. A conjunção de órgãos, músculos e o que mais se interliga para o adequado processo respiratório se foi enfraquecendo, a frequência cardíaca cai — 115… 76… sobe para 80… cai novamente –, chamamentos aflitos, urgente intervenção médica naquele paciente…

O inevitável estampa-se no rosto dos profissionais de saúde e Arthur Almada Lima Filho, respirando como um pássaro — leve e pouco –, morre com a cabeça aninhada entre as mãos de uma neta médica, filha do primeiro filho, que lhe herdou o nome como ele, Arthur Filho, havia herdado do pai igualmente grande magistrado.

Na solidão de uma UTI, os primeiros raios de sol saudavam de lá de fora o último fôlego do dedicado homem do Direito e da Justiça, da Educação e da Cultura, da Administração e da História, filho com grande Amor e Orgulho pelas coisas e causas da terra em que nasceu e para qual, em sentimento, palavras e trabalho, tanto se doou — Caxias.

*

Arthur vai para o Alto.

Arthur agora voa.

Ave, Arthur!

*

II

Há muitos anos que Arthur Almada Lima Filho dizia para a Família que, após sua morte, queria ser cremado — como, aliás, ocorreu com sua irmã Consuelo.

Extensivamente, Arthur dizia também que queria que suas cinzas fossem espargidas, lançadas no/do Morro do Araim, que fica em Caxias, ao lado da BR-316. É o morro de sua infância, onde, partindo ali do bairro Ponte, costumava brincar com os irmãos.

Ele complementava, brincando e falando sério, que as cinzas eram para ser lançadas por uma neta cavalgando um cavalo, ao som da “Cavalgada das Valquírias”, famosa composição musical que é o prelúdio (início) do 3º ato de “A Valquíria”, a segunda das quatro óperas que integram “O Anel do Nibelungo” (“Der Ring des Nibelungen”), do maestro, compositor, ensaísta e diretor de teatro alemão Wilhelm Richard Wagner (1813-1883).

Curiosidades:

1) As “valquírias” do título da música sugerida bem-humoradamente pelo Arthur são personagens da mitologia escandinava (Suécia, Noruega, Dinamarca, Islândia, no norte Europa). São mulheres mensageiras do deus Odin, encarregadas de escolher, entre os guerreiros mortos, aqueles mais heroicos, que seriam conduzidos para o Walhalla, um paraíso em forma de palácio onde os heróis eleitos passariam a ter uma vida de prazeres. Pois é, a seu modo, Arthur foi um guerreiro…

2) Do nome do ciclo operístico (tetralogia) “O Anel do Nibelungo”, destaque-se a palavra “nibelungo”, que tem várias etimologias, o maior número delas ligando “nibel” ao alemão “nebel” (névoa). Coincidentemente, a formação “lungo”, tomada isoladamente, tem em alemão uma palavra assemelhada: “lunge” (em inglês, “lung”), ambas significando “pulmão”. E, curiosamente, tem a ver com o pulmão a morte do desembargador Arthur Almada Lima Filho, que tanto gostava da composição wagneriana “O Anel do Nibelungo”, onde assoma o trecho “Cavalgada das Valquírias”.

*

III

Neste mês de outubro, dia 1º, convidado pelo Arthur, fomos jantar em um hotel de Caxias. Conversa vai, conversa vem, relembro-lhe seus livros “Efemérides Caxienses” e “Perfis” (onde ele juntou um texto biográfico que ele escreveu sobre mim). Depois, fiz referência a outros dois livros deles, com os títulos “Algumas Palavras” e “Outras Palavras”. Perguntei-lhe, qual seria, nesta linha, o próximo título. E o Arthur, rindo: “ – Últimas Palavras”.

Arthur Almada Lima Filho deixa algumas obras inéditas, para a Família, quem sabe, no devido tempo, autorizar a organização:

a) “Breve Graça” (livro de pequenos textos, dos quais alguns se encontram publicados com esse título no jornal “Folha do IHGC”;

b) uma coletânea de textos esparsos, publicados em vários jornais; e

c) uma nova grande obra de referência, após “Efemérides Caxienses”: o “Dicionário Bibliográfico de Autores e Artistas Caxienses”, de que tenho, entregues a mim pelo Arthur, cerca de 150 (cento e cinquenta) páginas em arquivo Word, o que, só aí, já chegaria a um livro de mais ou menos 250 a 300 páginas, formato 14cm X 21cm.

Em especial, outra obra que o Arthur Almada iniciou e não verá concluída é a que resulta de seu imenso esforço e competência de gestor: a inauguração da reforma completa da sede do Instituto Histórico e Geográfico de Caxias e anexos. As obras, depois de muitas gestões do Arthur, estão sendo executadas diretamente pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e compreendem, além da sede, um amplo auditório com espaço para exposições e outros eventos culturais e, em um terceiro prédio, espaços com computadores e outros recursos e equipamentos para cursos de profissionalização e/ou qualificação etc., além de urbanização e revitalização de toda a área de influência do edifício-sede e demais prédios que compõem o complexo da antiga Estação Ferroviária de Caxias — certamente um legado que amplia o nome, a memória, o amor e o trabalho do Ilustre Caxiense por sua terra. Quem sabe uma praça na área não se inaugure com o nome do caxiense, ou toda a estrutura não se batize com o nome “Complexo Histórico-Cultural Desembargador Arthur Almada Lima Filho”… Quem sabe…

*

IV

Em geral, Caxias pouco sabe dos esforços e da história, das lutas, lides e lidas de Arthur Almada Lima Filho, caxiense que, à maneira de Bilac, amou com fé e orgulho a terra em que nasceu.

Juiz de Direito, desembargador, vice-presidente e presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão, presidente da Federação das Escolas Superiores do Maranhão (FESM, nascente da Universidade Estadual maranhense – UEMA), que o colocou na galeria de ex-reitores), Arthur Almada Lima Filho é citado no prestigioso e internacional “Who’s Who”; seus votos como jurista são transcritos em obras de Direito; tem seu nome na testada de prédios públicos, seja em fórum seja em escola, Maranhão adentro, tais os méritos que a sociedade maranhense quis reconhecer e homenagear. Autor de livros, pesquisador infatigável, magistrado intimorato, honrou o nome e o ofício do pai e o conceito da família — família que, no passado e no presente (e, pelo visto, para o futuro também), legou tanta gente inteligente para Caxias, para o Maranhão e para o Brasil.

Arthur e eu somos conterrâneos, confrades, companheiros e amigos, pertencemos às sadias — e lutadoras — hostes do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (IHGM), do Instituto Histórico e Geográfico de Caxias (IHGC), da Academia Caxiense de Letras (ACL), da Academia Sertaneja de Letras, Educação e Artes do Maranhão (ASLEAMA), da Academia Brasileira Rotária de Letras e do Rotary Club. E não estamos nisso apenas para estar ou ser, mas para fazer.

É preciso ter convivido ao menos um pouco com o Arthur para ver-lhe os esforços em nome de coisas e causas coletivas, caxienses. É preciso ter estado um pouco mais perto do Arthur para dele ter ouvido exemplos de inconteste entusiasmo e incontida satisfação quando da descoberta de um novo nome de caxiense de talento, ou nova informação sobre Caxias, dados que zanzavam por aí, escondidos sob a poeira da História ou maquiados, encobertos pelo pó do desinteresse humano.

No fim do ano 2013, Caxias e o Maranhão receberam de presente uma volumosa obra (“Efemérides Caxienses”) em que Arthur Almada organizou, sistematizou e sintetizou eventos passados, com nomes e datas da História caxiense, mas com pontos de contato com a História maranhense e brasileira. Como diz o Arthur, ausente todo laivo de ufanismo: ” — Não há História do Brasil, sem a História de Caxias”. E, com ardor e energia moças, organizava e escrevia novas obras de fôlego, como os “Perfis”, que foram publicados, e o “Dicionário Biobibliográfico de Autores e Artistas Caxienses” (previsto para sair em dois volumes).

Quando ele completou 88 anos, em 17/10/2017, escrevi que esse renovado Arthur sentava-se à sua távola quadrada e pequena em uma modesta sala no pavimento superior do remoçado prédio da Estação (sede do IHGC) e danava-se a ler, estudar, pesquisar, escrever, telefonar para outros membros e apoiadores do Instituto, sempre tendo em vista algum aspecto da gestão da Entidade ou, o mais das vezes, sobre fatos históricos de Caxias, cujos documentos ou livros a eles relacionados, existentes no Brasil ou no Exterior, Arthur pedia que fossem pesquisados ou conseguidos exemplares ou cópias, para o acervo do Instituto.

Para Arthur Almada Lima Filho o passado de Caxias não era aborrecimento nem tempo perdido, mas desafio e combustível; era mister de arqueólogo, mistério que ele, detetive d’antanho, ia descobrindo camada a camada, limpando as contaminações, rearrumando, pondo em ordem — e dando ao conhecimento de seus conterrâneos e outros interessados, pelas vias da voz (em palestras) e das letras (em textos).

Caxias e os caxienses, o Maranhão e os maranhenses ainda terão tempo para aquilatar direito a imensa perda que é o falecimento de Arthur Almada Lima Filho, sobretudo a excepcional figura humana que não fugiu à luta do ver e do viver, do escrever e do fazer, do pesquisar, documentar ne disseminar, do ser e do reconhecer.

Arthur deixa um grande legado.

Serão necessários muitos ombros, mãos e mentes para carregá-lo e dele cuidar…

Descanse em paz, Arthur.

Pois a Eternidade, enfim, lhe chegou.

*

V

SOBRE ARTHUR ALMADA LIMA FILHO
— Caxiense; professor, historiador, promotor, magistrado (juiz de Direito e desembargador), gestor público, administrador, advogado, escritor.

ESCOLARIDADE: Curso primário: Grupo Escolar “Estêvão de Carvalho”, em Viana. Curso ginasial: Ginásio Caxiense, em Caxias. Curso clássico: Colégio do Estado, em São Luís. Curso de Direito: Faculdade de Direito de São Luís. Curso de mestrado: Administração Pública, Fundação Getúlio Vargas (FGV), Rio de Janeiro. Foi presidente do Diretório Acadêmico Clodomir Cardoso, da Faculdade de Direito de São Luís. Em 1955, foi eleito presidente da União Maranhense dos Estudantes e conselheiro da União Nacional dos Estudantes (UNE).

ATIVIDADES PROFISSIONAIS: Promotor Público nas Comarcas de Brejo e Chapadinha; Juiz de Direito nas Comarcas de Chapadinha, Viana, São José de Ribamar, Caxias e São Luís; Juiz Supervisor do 2º Juizado Informal de Pequenas Causas; Desembargador do Tribunal de Justiça do Maranhão; Juiz, Vice-presidente e Presidente do Tribunal Regional Eleitoral. Foi assessor administrativo dos Diários Associados no Maranhão (O Imparcial e Rádio Gurupi).

Professor e Diretor Fundador do Ginásio Brejense, em Brejo; Professor e Diretor do Ginásio “Professor Mata Roma” e Fundador do Curso Normal “Anna Adelaide Bello”, em Chapadinha; Fundador do Centro de Cultura “Profª Maria do Amparo”, em Milagres do Maranhão; Professor do Colégio do Estado (Liceu Maranhense); Professor e Diretor da Escola de Administração Pública do Estado do Maranhão (EAPEM); Presidente da Federação das Escolas Superiores do Maranhão (FESM), atual Universidade Estadual do Maranhão (UEMA); Diretor da Escola Superior da Magistratura do Maranhão (ESMAM); Coordenador do Curso de Direito da Faculdade do Vale do Itapecuru (FAI).

INSTITUIÇÕES A QUE PERTENCEU: Sócio efetivo do Centro Cultural “Coelho Neto”, de Caxias; Academia Caxiense de Letras; Academia Brejense de Artes e Letras; Academia Maranhense de Letras Jurídicas; Academia Sertaneja de Letras, Educação e Artes do Maranhão; Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão; Instituto Histórico e Geográfico de Caxias; Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Associação dos Magistrados do Maranhão (AMAM), Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG); Ordem dos Advogados do Brasil (OAB – Maranhão).
CONDECORAÇÕES / DISTINÇÕES: Medalha do Mérito Judiciário “Antônio Luiz Velozo de Oliveira”; Medalha de Prata “Desembargador Bento Moreira Lima”; Medalha de Ouro “Desembargador Bento Moreira Lima”; Medalha “Ministro Carlos Madeira”; Medalha da Ordem do Mérito Cultural “Poeta Gonçalves Dias” no grau de Comendador; Medalha do Mérito Eleitoral” Ministro Arthur Quadros Collares Moreira”; Medalha do Mérito Universitário “Joaquim Gomes de Sousa”; Medalha do Mérito Acadêmico ESMAM; Medalha dos 200 Anos do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão; Medalha do Centenário da Loja Maçônica Renascença Maranhense; Medalha do Centenário de Nascimento de Santos Dumont; Medalha “Coelho Neto”; Medalha “César Marques”; Medalha “Teixeira Mendes”; Medalha da Academia Maranhense de Letras Jurídicas; Medalha do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão; Medalha “Acyr Marques”; Medalha do Mérito Distrital “Celso Nunes” do Distrito 4490 do Rotary International; Medalha “Paul Harris”, do Rotary International; Medalha do Bicentenário de Nascimento de João Lisboa. Diploma de Legionário da Legião Barão de Caxias.

Cidadão honorário dos municípios de Brejo, Chapadinha, São José de Ribamar, Milagres e São Luís.

EDMILSON SANCHES
[email protected]
Administração – Comunicação – Desenvolvimento – História – Literatura // PALESTRAS, CURSOS, CONSULTORIA

Fotos: Arthur Almada, seus livros e com estudantes visitantes do Instituto Histórico e Geográfico de Caxias, que eram recebidos pessoalmente por ele, presidente da “Casa de César Marques”.

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