Os “caretas” do Reisado e as heranças culturais de minha infância

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*Alberto Pessoa (novaimagemrevista.com.br)

Neste dia 06 de janeiro a comunidade do município de Matões, Maranhão finalizou a manifestação cultural tradicional daquele povo: a festa do Reisado.

Eu era criança, 10 anos, morávamos na zona rural de Matões. Me recordo que o período das festas de Reis era marcante  em nossas memórias.

Não entendia bem como acontecia, so sei mesmo que nas madrugadas, éramos despertados pelo som do violino, tambores, marcando os cânticos característicos do reisado,  pelo barulho dos “caretas “, mascarados e vestidos com indumentárias confeccionadas com folhas de bananeiras e tucum, o “Caipora”.

Um cavalo-de-pau ou “babau” com cabeça de cavalo empalhada, conservada e ressecada após a morte de um felizardo ou infeliz animal que se ia durante o ano e tinha “seu crânio” emprestado para completar o conjunto instrumental da apresentação. 

Tinha também a Burrinha  do Meu Amo, onde uma mulher com roupa colorida portava um cabaça arredondada na cabeça com vela ao meio, que refletia cores diversas através de furos revestidos em papel colorido: muito bonito.

O propósito desta manifestação é  manter viva a tradição cultural e ainda angariar alimentos e  outras doações para serem usados na festa final em homenagem aos três reis magos que anunciaram a chegada do Menino Jesus ao mundo.

“Esses grupos de reisado, com os caretas e outras personagens, são expressão forte da religiosidade e da cultura popular deste povo que se mantém viva no decorrer dos tempos“, lembra Simeão Pereira, da Academia Matoense de Letras.

De acordo com as pesquisas do escritor matoense, Francisco José da Silva (Chico Grude), em sua obra CAMINHOS E MEMÓRIAS DE MATÕES: UMA HISTÓRIA SECULAR”, as festas populares em homenagem aos Santos Reis começam, no interior do Maranhão, após as de natal e se estendem até 06 de janeiro, dia consagrado aos Reis Magos no calendário cristão.

Também faz parte das manifestações culturais em nosso município de Matões. No passado eram muito animadas, pois suas programações funcionavam apenas depois das 22 horas e se estendiam até às 5 horas da

manhã, ou seja, após serem trancadas as portas das casas à noite e antes de serem abertas na manhã seguinte – pelo menos este é o horário estabelecido no ritual matoense.

– Conheci ainda o Reisado organizado pela Sra. Maria Rubim, velhos costumes que hoje já não são mais valorizados e a cada dia vão morrendo. É o folguedo mais divertido e alegre, com o barulhento grito dos caretas. Esta personagem apresenta-se com horrorosos disfarces: máscaras rústicas, grotescas, de barbas longas, dentes ameaçadores, chapéu de couro, alpercata “correlepes” e o indefectível chiqueirador. São os batedores do A “burrinha”, é uma figura mitológica de cabeça e pescoço com aparência de muar e uns quadris avantajados, cobertos de embira de buriti, à havaiana, para dar graça aos seus saracoteados de exótica dançarina, ginga e pula a noite toda. O seu condutor, escolhido entre os mais hábeis do ofício, desempenha o seu papel, dando aparência de estar montado na “burrinha” e o resultado é a exibição de uma burrinha de dois pés. Os demais figurantes, do conjunto, aparecem sem disfarce -, cita o escritor.

Os “caretas” dão início, diariamente, à função fazendo enorme estardalhaço. Zurram com estridência a cada momento, a pretexto de avisar aos moradores circunvizinhos a saída do “Reis”. E, por mais estranho que pareça, esse sistema original de comunicação dá resultado.

Ao chegar o grupo no terreiro da casa escalada para a visita, todos os moradores vizinhos vêm, mas temem represália dos “caretas” – começa a representação burlesca do Reisado. Rompe a música. O grupo de cantadores entoa as cantigas. A burrinha dança, pula e saracoteia. E os “caretas” esbanjam uma comicidade ridícula. Tudo orientado no sentido de abiscoitarem o óbolo pretendido.

Recebida a “esmola”, o grupo parte para novo ataque a outra casa, depois de cantar versos louvaminheiros de agradecimentos e despedida.

Ô de casa! Ô de fora!

– Menina vai ver quem é.

– São os três reis do oriente

Que voltam pra Nazaré.

Senhora dona da casa,

No seu lençol cochilando,

Tenha dó de quem está fora

No vento se resfriando

O dono dessa promessa

Estava de vela na mão,

Não fosse a graça do santo,

Estava debaixo do chão.

Bendito louvado seja

Uma luz já se acendeu

Lá vem o dono da casa

Pra nos dar o que é seu.

– Boa noite minha gente

Tá aqui a ajuda prometida

Aos devotos dos Santos Reis,

E à Senhora Aparecida.

Meu senhor, dono da casa,

De fita verde no chapéu,

Você e seu povo todo

Parecem uns anjos do céu.

Ano-Bom, Festa e Reis.

Nunca se pede a um ninguém

Só se pede em casa nobre

E a quem a gente quer bem.

Em Matões também existiu, por muitos anos, um reisado diferente, trazido de Alcântara-MA pela professora Alice Nogueira, esposa do Coletor Paulo Nogueira, que instituiu a nova manifestação cultural: “As Pastorinhas e Floristas”.

Um grupo de moças bonitas da cidade era selecionado, treinado e depois passavam a fazer apresentações nos mesmos moldes do reisado, tarde da noite, depois das casas fechadas. Uma forma de drama, as mesmas dançavam e cantavam organizadas em dois cordões. Cantoras: Antonieta Duarte (irmã da Adelina Coletora, esposa de Demerval, pai do Médico de Timon, Dr. Murilo Noleto), Chica do Divino, Dedé, Belinha, Maria das Dores, Carmina, Tatá, Lacok Nascimento, Luzia Nascimento, Maria Albertina, Zuza e Conceição da Princesa.

Esta programação foi resgatada pela Sra. Maria do Manuca Carvalho, por muito tempo tinha a seguinte composição para apresentações: Duquinha – Estrela; três moças representando os três Reis Magos; duas moças – Floristas; duas moças Ciganas. Todas trajando a rigor estilo próprio.

Instrumentos musicais: castanholas, viulim (Sr. Abílio Araújo), pandeiro (Melé), violino (Sinhozinho Oliveira).

A ORIGEM

O Reisado, também chamado de Folia de Reis, é uma manifestação popular que celebra o nascimento do menino Jesus e rememora a visita do três reis magos a Belém. O Reisado é uma festividade tradicional do Dia de Reis, e em partes do país as tradições desse dia são patrimônio cultural imaterial, com a – hierofania (manifestação do sagrado em objetos, formas naturais ou pessoas); reúne, assim, elementos sagrados e profanos.

O reisado é considerado o folguedo mais representativo do ciclo natalino e tem o Nordeste como seu território de referência. A tradição de enaltecer o nascimento de Jesus com cantos, danças e visitas às casas dos moradores, tem origem em Portugal e foi transmitido para o Brasil pelas trilhas da colonização.

O Reisado possui um caráter cultural e religioso, e ocorre no período de 24 de dezembro a 6 de janeiro (Dia de Reis ou Dia dos três Reis Magos).

O Reisado é caracterizado como cultura popular devido a sua forte ligação histórica com o passado, respondendo questões do presente ligadas à população e compreendendo detalhadamente a história de um povo, sendo esta absorvida através do entendimento do processo estabelecido.

O Reisado é de origem egípcia, considerada uma festividade profano-religiosa. No Egito era chamada de Festa do Sol Invencível, comemorada em 6 de janeiro. Na Europa foi adotada, inicialmente, pelos romanos em 25 de dezembro (data em que nasceu Jesus Cristo, segundo os cristãos).

De origem portuguesa, o Reisado chegou no Brasil por volta do século XIX. O nome do folguedo é em homenagem aos grupos que brincam na véspera e Dia de Reis (06 de janeiro), comemorando a chegada do menino Jesus e homenageando os três Reis Magos (Gaspar, Melchior e Baltazar).

O giro, a jornada ou a peregrinação dos foliões reproduzindo a viagem dos Reis é a “essência do ritual”, momento em que as pessoas cumprem o ‘contrato’ ou promessa com os Santos Reis de várias formas.

*Alberto Pessoa é jornalista e escritor caxiense licenciado em Geografia pela UEMA, membro do Instituto Histórico e Geográfico de Caxias (IHGC), do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão.  Da Academia Aguaslindense de Letras (ALETRAS) e da Academia Taguatinguense de Letras.

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